Alunos de escola paulista criam audiolivros para colegas que não podem ler

Os estudantes do Ensino Fundamental gravam livros no intuito de auxiliar colegas com deficiência em colégio de Itanhaém, no litoral paulista.

Educação Inclusiva. Educar todas as crianças no mesmo contexto escolar. Enxergar crianças especiais como diversidade, não como um problema. Processo de transformação no qual a participação de todos os estudantes é possibilitada. Conceituar a educação inclusiva é fácil, mas e quanto colocar tais definições em prática?

A comunidade escolar de um colégio da cidade de Itanhaém, no litoral paulista, conseguiu tirar isso de letra ao desenvolver um projeto que cria audiolivros para alunos que não podem ler. Tudo começou a partir da observação de um aluno que, apesar de não compreender o que estava escrito, seguia folheando os contos escritos pelos próprios colegas.

Não lia, mas observava todas as figuras com o máximo de atenção. O adolescente é epilético e possui síndrome paralítica. Além disso, perdeu o pai no ano passado, vítima de um infarto fulminante. Porém, nem todos os desafios do mundo puderam pará-lo e seus esforços despertaram uma ideia nos colegas e educadores: transformar linhas em sons.

Quem começou tudo foi Alessandra Aparecida Sales Cavalcante, coordenadora da escola Maria Aparecida Soares Amêndola, situada em uma das regiões mais pobres da cidade. “Por que não produzimos um audiolivro para ele também ouvir as histórias”?. Alunos de boa vontade e professores com formação musical foram os ingredientes mágicos para o projeto.

Iniciativa que não atenderia somente ao adolescente que citamos aqui. A escola tem mais dez casos de alunos especiais. Sendo assim, os audiolivros produzidos incluiriam todos os colegas com deficiências física, auditiva, mental, visual, síndrome de Down e autistas. Tudo com o uso de livros clássicos e um microfone.

Como eles fizeram

“Para que usar materiais prontos se temos alunos tão bons”? Foi nisso que a orientadora pensou ao iniciar o projeto. Nas primeiras gravações, usaram clássicos como Os Três Porquinhos, A Princesa e a Ervilha, A Bela e a Fera… O modus operandi segue o mesmo: cada um grava um conto, com as falas captadas pelo microfone para posterior edição.

Foto: Josy Inácio / Prefeitura de Itanhaém

E toda boa história precisa de efeitos especiais, não é verdade? Por isso, o trabalho só é concluído com a adição de sonoplastia. Aquela gota de chuva caindo, a porta que bate, o som dos sapatos no chão. São detalhes que fazem toda a diferença na imaginação de quem escuta!

Durante as gravações, só um aluno e o professor entram na sala, nada de amigos por perto.
No início, não foi fácil. Os alunos precisaram driblar o nervosismo e vícios de leitura para que tudo saísse como o planejado. Todos os erros, entretanto, foram corrigidos ao longo do tempo. E sabem qual é a novidade?

Além das histórias faladas, o projeto de audiolivros ganhou uma nova forma de inclusão: a Linguagem Brasileira de Sinais (Libras). Uma das alunas, cujos pais e irmão são deficientes auditivos, conseguiu gravar um vídeo traduzindo um dos contos para facilitar o entendimento e comunicação.

Superação

Já falamos que a escola fica em um dos bairros mais pobres de Itanhaém, litoral de São Paulo, certo? Mas, os desafios não param por aí. Além da realidade de carência na qual muitos sequer conhecem um shopping center, algumas das crianças enfrentam problemas familiares graves em casa.

E, se não bastasse as lutas diárias, o colégio foi invadido no início do ano sofrendo roubos e depredações em sua estrutura. A comunidade escolar inteira, incluindo professores e pais, se envolveu na reconstrução do local, usando recursos financeiros próprios. “Falam que somos uma fênix, vivemos renascendo”, comenda a coordenadora, Alessandra.

Foto: Josy Inácio / Prefeitura de Itanhaém

Como bons brasileiros, eles não desistem nunca! O projeto com audiolivros está indo tão bem que, desde maio, já foram 20 gravações atendendo a três escolas da rede municipal de ensino. A meta é que, até o final do ano, pelo menos 60 títulos já estejam gravados no intuito de disponibilizar o acervo na biblioteca municipal da cidade.

Sandra Regina, diretora da escola, afirma que todo o trabalho é feito de forma muito natural, “por isso, acreditamos que as pessoas têm sido tocadas”. E sabem qual é a recompensa maior? Ouvir colegas como aqueles que inspiraram o projeto dizendo que “agora, conseguem ler um livro”.

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