Conheça Milpa Alta, o lugar onde ainda se mantém as tradições astecas

Uma das demarcações da região administrativa da capital mexicana, Milpa Alta conserva o idioma asteca e o sistema de rotação de culturas.

Os séculos XIV e XVI abrigaram os povos astecas, grupos étnicos do México Central que dominaram boa parte da Mesoamérica. Organizados em cidades-estado, as altepetl, constituíram o Império Asteca com três capitais: Tenochtitlán, Tlacopan e Texcoco. A língua principal dos astecas era o náuatle e a agricultura era baseada no sistema de rotação.

E, por que estamos falando tudo isso? É que, apesar da supressão dos povos pré-colombianos pelos colonizadores europeus e a própria modernização, a cultura asteca ainda resiste nos arredores da Cidade do México, capital do país. Deixando para trás o movimento da metrópole, está Milpa Alta, onde ainda são mantidas as tradições astecas.

Uma das 16 demarcações territoriais da capital mexicana, Milpa Alta tem seu nome proveniente do vocábulo milplan, termo usado para designar um campo alto de milho cultivado. Fundada por frades franciscanos no século XVI, a cidade é, de certa forma, negligenciada pela metrópole a qual faz parte, mesmo ali, na encosta de sua montanha.

O caminho até lá não é tão fácil de percorrer. A estrada que leva à região é nova, mas a delegação vizinha, Xochimilco, padece de congestionamentos que atrasam a viagem do ônibus que parte de sua estação. Em média, um turista leva duas horas para chegar a Milpa Alta, mas a poluição deixada para trás e a vista das montanhas faz valer a pena.

Chegando no destino, o viajante pensa ter percorrido léguas desde a Cidade do México. A população local mantém as tradições centenárias de seus ancestrais pré-colombianos, muitas ruas ainda não são asfaltadas, boa parte do perímetro é composto por florestas e campos. Barulho, trânsito e miséria da capital desapareceram milhas atrás.

Foto: MEGAN FRYE/BBC

Milpa Alta e as tradições astecas

Imagine se alimentar de produtos cultivados de forma orgânica, livres de pesticidas, irrigados pela chuva e brotando de uma terra arada por cavalos! Sim, isso ainda existe e é a agricultura mandatória em Milpa Alta. Por lá, os agricultores praticam o sistema de rotação de culturas, assim como era feito no Império Asteca.

O principal cultivo é o milho e a variedade é imensa. Milpa Alta ainda é responsável pela produção de boa parte dos alimentos que seguem para a capital, como o nopal (cacto comestível), mole (molho mexicano), tortillas e mel. A dieta local é ainda composta por frutas, como carambola, uva e goiaba.

Foto: SIMON GLOGIEWICZ/ALAMY STOCK PHOTO

O lar de animais silvestres, como veados e coelhos, é autossuficiente há séculos. Seus moradores conservam um sentimento de irmandade mantendo vivos os costumes nascidos ainda com os astecas. O principal deles é o náuatle, língua falada pelos grupos étnicos mesoamericanos há mais de cinco séculos.

Rituais religiosos, como os temascals, banhos de suor com propriedades curativas e espirituais, ainda são realizados pelos líderes, os xamãs. As festividades seguem como motivo de orgulho local, especialmente um festival de verão realizado em cada um dos 12 povos de Milpa Alta.

A maior parte das festas inclui peregrinações religiosas, danças tradicionais e a guarda de um ícone religiosos nas casas dos moradores, chamada de mayordomías. Ah, e você já ouviu falar na importância do Dia de los Muertos (Dia dos Mortos) para os mexicanos? Em Milpa Alta, a festa tem um toque especial!

A comemoração mesmo se dá nos dias 01 e 02 de novembro. Mas, os moradores da região saem pelos cemitérios para informar os convidados, os mortos, sobre as celebrações. O “convite formal” é feito no dia 29 de setembro, garantindo que os finados venham até suas casas para comemorar o feriado que mistura tradições indígenas e católicas.

A receptividade dos moradores também reflete a manutenção de costumes antigos. Turistas, que são raros por ali, são frequentemente convidados pelos locais para uma conversa regada a pulque picante, um néctar de algarve fermentado, acompanhado de tlacoyo fresco, tortilla de milho cuja massa é recheada com queijo, feijão ou carne.

Todos por ali se conhecem pelo nome e reconhecem que dependem uns dos outros. É uma forma de ainda resistir ao tempo que, aos poucos, tenta tomar de assalto uma cultura nascida há séculos.

Discriminação

Moradores ainda tentam manter vivo o náuatle, mas não se sabe até quando vão conseguir. Na década de 80, foi feita uma proposta ao governo para que a língua fosse ensinada nas escolas de forma obrigatória. No entanto, o espanhol seguiu sendo ensinado como idioma oficial, acompanhado do francês, inglês e alemão como segunda língua.

A justificativa era aumentar as chances de emprego e educação dos alunos. O resultado é a discriminação daqueles que ainda falam um idioma indígena. Felizmente, a nova geração enxerga suas ancestralidades indígenas com orgulho e tenta não se restringir à preocupação com o crescimento de pessoas de fora da delegação.

Além das áreas verdes e estilo de vida, os moradores manter sua identidade junto ao mundo globalizado. Seus esforços representam um grande avanço e servem como exemplo para aquelas comunidades importantes para manter a vida das metrópoles, mas que, a despeito disso, seguem sufocadas pela civilização dita evoluída.

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