Os Soldados Da Borracha

A seringueira á a árvore responsável por produzir o látex (borracha natural). A extração desse produto ganhou forte estímulo no final do século XIX e início do século XX devido à expansão da indústria automobilística, fazendo com que o país se tornasse o maior exportador mundial de borracha. O Brasil ocupa o nono lugar na produção da matéria-prima, ficando atrás de países asiáticos como Tailândia, Indonésia, Malásia, China e Vietnã.

No Brasil, o período que antecedeu a efetivação da industrialização por volta da década de 1930, teve a sua economia baseada na agro exportação. Produtos como o açúcar, ouro, borracha e café já foram um dos pilares de sustentação econômicos do país. Nos livros de história capítulos inteiros são destinados ao estudo dos mecanismos de produção do açúcar e do café e da exploração das minas de ouro brasileiras, no entanto durante a nossa vida escolar pouco ouvimos falar sobre a borracha, matéria-prima valiosa para a produção de diversos gêneros.

Entre o final do século XIX e os primeiros anos do século XX, esse produto ganharia destaque na economia nacional, a expansão da indústria automobilística levou a necessidade de uma maior produção da borracha, material necessário para a fabricação de pneus. Fábricas principalmente dos Estados Unidos passaram a comprar a borracha exportada do Brasil, fazendo com que o país se tornasse o maior exportador mundial do produto. A abundância de seringueiras (árvore que produz o látex, a borracha natural) nas regiões do Pará e Amazonas facilitou a expansão das exportações.

A intensificação da produção levaria o Brasil a exportar cerca de quarenta mil toneladas do produto em 1910, isso geraria a necessidade de um maior número de mão-de-obra nos seringais. Na primeira metade do século XX a seca e a fome devastavam as populações do sertão nordestino, sabendo das ofertas de trabalho nas regiões de extração da borracha, muitos trabalhadores do nordeste brasileiro iniciaram um ciclo migratório para as florestas do Pará e Amazonas em busca de uma vida melhor.

A borracha não foi responsável apenas por permitir o aumento das produções nas fábricas, mas também pelo crescimento econômico do norte do país. As cidades mais beneficiados foram Belém e Manaus, houve uma intensa transformação e modernização desses centros urbanos, inclusive uma intensificação da vida cultural para atender as necessidades da elite local que precisava de festas e eventos para ostentar suas joias e vestidos caros. Houve uma significativa melhoria na vida dos habitantes dessas cidades e dos donos dos seringais, mas o mesmo não se pode dizer dos trabalhadores que se embrenhavam nas matas para extrair o látex das seringueiras.

O declínio do ciclo da borracha aconteceria no início do século XX, quando as metrópoles inglesas e holandesas passaram a produzir em suas colônias asiáticas o produto. O aumento da concorrência levaria a diminuição dos preços e consequentemente a queda na exportação. Os barões da borracha decretaram falência e deixaram um grande rombo nos cofres públicos, pois o governo comprava a borracha para estocar na tentativa da elevação dos preços. Assim chegava ao fim um dos mais importantes e desprezados ciclos econômicos do país, porém essa história ganharia novos capítulos a partir da década de 40.

A eclosão da Segunda Guerra Mundial em 1939 pressionaria os países americanos a tomar partido de algum dos lados beligerantes, o Brasil e os Estados Unidos optaram pela neutralidade. Os norte-americanos se aproveitariam da guerra para alavancar a sua economia fornecendo matérias-primas para os países envolvidos diretamente no conflito, já o Brasil vivia a ditadura do Estado Novo imposto pela Constituição de 1937, criada durante o governo de Getúlio Vargas.

O ataque à base militar de Pearl Harbor no Havaí e os torpedos lançados por submarinos alemães contra navios brasileiros levariam a uma mudança de postura dos dois países. Os Estados Unidos declararam a sua entrada na guerra e o Brasil criou uma força expedicionária para lutar contra os nazistas na Itália, a FEB. Com a adesão dos norte-americanos a Segunda Guerra, países asiáticos cortaram o fornecimento de borracha aos Estados Unidos, nesse contexto o governo brasileiro firmou um acordo para o fornecimento de borracha ao país. Para conseguir cumprir com o acordo estabelecido, o Brasil começa um recrutamento de homens a serem enviados para a região amazônica no intuito de trabalhar na extração do látex. Era o início de uma batalha silenciosa: a Guerra da Borracha, os recrutados para essa missão ficariam conhecidos como Os Soldados da Borracha.

O segundo ciclo da borracha contou com a participação de sessenta mil trabalhadores que em sua maioria migraram de Estados Nordestinos, principalmente do Ceará. O governo fez uma intensa propaganda sobre o “ouro branco da Amazônia” (a borracha) e iludiu esses homens sobre a possibilidade de enriquecimento fácil na empreitada, desenhistas foram contratados para ilustrar panfletos que incentivavam a adesão de outros trabalhadores. Cansados da miséria em que viviam esses nordestinos rumaram para o Norte em busca de uma vida melhor.

Muitos desses homens levaram suas famílias, que ao chegarem ao “front amazônico” acabaram participando sem nenhum direito garantido do processo de extração e produção da borracha. O trabalho era realizado durante seis dias da semana, o intenso ritmo de produção deveria dar conta das trinta e cinco mil toneladas de borracha prometidas ao governo norte americano. No dia que deveria ser destinado ao descanso os soldados da borracha trabalhavam na plantação de roças de subsistência, para conseguir alimentar a família.

Assim que chegavam à selva, o governo passava a responsabilidade dos trabalhadores aos coronéis donos dos seringais, muitos morreram pelas mãos dos patrões quando os questionavam pelos salários que muitas vezes não recebiam. Os maiores beneficiados com o crescimento econômico promovido pela borracha foram os norte-americanos, o governo brasileiro e os “barões da borracha”. Aos soldados sobrava à dura realidade de viver em uma selva a qual não estavam habituados, cerca de trinta e cinco mil trabalhadores morreram em decorrência de doenças como a malária e a ataques de animais selvagens, como cobras e onças pintadas, o regime de trabalho se assemelha a escravidão. Com o fim dos conflitos houve uma queda na produção da borracha brasileira devido à retomada da produção nos seringais asiáticos, muitos donos abandonaram os seringais e os trabalhadores foram deixados à própria sorte.

““A constituição de 1988 garantiu aos” ex-combatentes dos seringais” o pagamento de uma pensão vitalícia no valor de dois salários mínimos, caso fosse comprovada a necessidade do “auxílio”. No início de 2014 alguns ex-seringueiros começaram a receber uma indenização como reconhecimento pela participação na Segunda Guerra Mundial, nada mais justo visto que esses soldados anônimos contribuíram mesmo de que forma indireta para o desenvolvimento do conflito.

Lorena Castro Alves
Graduada em História e Pedagogia

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1 comentário
  1. Emily Diz

    porque os soldados de borracha eram importantes para a industria autobilistica e alimenticia naquele periodo?

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