A Revolta da Vacina

A Revolta da Vacina deixou um saldo de trinta mortes e mais de cem feridos. O castigo dos revoltosos variava desde castigos físicos, prisões e deportações para o Estado do Acre.

Introdução

O fim da escravidão no Brasil e o aumento do número de imigrantes no final do século XIX e início do século XX transformariam de forma abrupta a realidade dos grandes centros urbanos do país.

Escravos e imigrantes se dirigiram para as principais cidades brasileiras em busca de emprego, Rio de Janeiro e São Paulo tornaram se o principal destino de pessoas que acreditavam que migrar para a zona urbana seria a solução para os seus problemas. O investimento em industrialização gerou um aumento no número de vagas de emprego o que atraiu essa população mais pobre.

Quando chegavam às cidades logo conseguiam se ajustar em algum trabalho, mas como a mão de obra era desqualificada os patrões pagavam salários miseráveis. A rotina de trabalho era exaustiva, a falta de fiscalização e de leis trabalhistas eficientes contribuía para a exploração dos empregados.

Causas

Homens, mulheres e muitas vezes até crianças chegavam a cumprir uma rotina de trabalho de dezesseis horas por dia. O salário mal dava para a alimentação, constantemente endividado devido ao alto preço dos alugueis, os trabalhadores viviam em moradias precárias, em um ambiente insalubre sem as menores condições de saneamento básico.

Uma dessas moradias era o cortiço, um conjunto formado por diversas casas e habitado por várias famílias. Outro tipo de moradia coletiva era as vilas operárias, criadas pelos empregadores em regiões afastadas das cidades e próximas as fábricas, essas construções era uma forma do patrão manter o funcionário próximo ao local de trabalho e debaixo da sua constante vigilância. Esse aumento populacional contribuiria para a proliferação de diversas epidemias, o que preocuparia os agentes sanitários do governo.

Visando acabar com esses problemas gerados pela expansão populacional, os governos federal e municipal lançariam uma campanha para revitalizar os centros urbanos. Além de tentar conter o alastramento das epidemias, o governo do Rio de Janeiro tinha em mente um projeto para aumentar o turismo na cidade, para isso ele precisaria modernizar o sistema de transporte, alargar as ruas, o objetivo era embelezar a cidade e retirar do centro aquilo que pudesse desagradar às elites e os turistas.

A reforma urbana coordenada pelo então prefeito Pereira Passos da início a retirada dos cortiços e de outras moradias de famílias pobres das áreas centrais da cidade. A ordem era demolir tudo para conter as epidemias e dar passagem ao progresso, essa política também ficou conhecida como “bota abaixo”. Os moradores sem ter onde ficar são transferidos para as regiões mais afastadas da cidade, o prefeito Pereira Passos, segundo alguns historiadores é o responsável por estimular o surgimento das primeiras favelas cariocas.

A reforma urbana empreendida pelo prefeito Pereira Passos contou com o total apoio do presidente da república a época, Rodrigues Alves. Essa medida colaborou para o aumento das contradições entre ricos e pobres, a população mais carente foi marginalizada, sofreu todo tipo de preconceito e exclusão social.

Vacinação Obrigatória

Somando-se a reforma urbana o governo inicia um intenso programa de erradicação das epidemias, liderada pelo médico sanitarista Oswaldo Cruz as campanhas de vacinação pegaram a população de surpresa. No dia nove de novembro de 1904 um decreto foi publicado autorizando a vacinação obrigatória da população contra doenças como febre amarela, varíola, peste bubônica e sarampo. A população se rebela contra a arbitrariedade do governo, essa reação ficou conhecida como Revolta da Vacina.

Os versos escritos abaixo ilustram muito bem o contexto social do período da revolta popular contra a vacinação.

Em uma época um pouco distante,
Na cidade que hoje é maravilhosa,
Ocorreu uma revolta horrorosa.
Cortiços insalubres e lotados
Abrigavam os pobres.
O povo morria
E de várias doenças padecia.
Oh, que passado triste!
O pessoal da lei não dava para os pobres ouvidos.
As vozes destes não passavam de meros ruídos.
E os barracos humildes,
Nada mais eram que estorvos do progresso.
Olhos assustados não eram significantes,
Muito menos os gritos sufocantes.

(Revolta da Vacina-Bianca Ferreira Moraes)

Revolta

A reforma urbana e a campanha de vacinação em massa contribuíram para a diminuição das doenças e dos ambientes insalubres, teria sido uma excelente estratégia de governo, no entanto o autoritarismo empregado pelos agentes de vacinação criou um ambiente de pânico entre a população pobre e trabalhadora.

A campanha se tornou tão rígida, que os atestados de vacinação passaram a ser exigido em diversas situações: casamento, matrícula escolar, empregos públicos, hospedagem em hotéis, empregos em fábricas, etc.

É incontestável a importância das campanhas de vacinação, porém diferente do que ocorreu no início do século XX no Rio de Janeiro, a população brasileira atualmente é orientada sobre os benefícios das vacinas, muitas doenças foram erradicadas do Brasil e isso se da ao fato da conscientização da população através de propagandas em rádio, tv ou internet promovida pelos órgãos de saúde.

Em 1904 uma mistura de medo e revolta tomou conta da população, a reforma urbana já os tinha excluído e agora a violência empreendida nas campanhas de saúde deixava essas pessoas assustadas. A falta de informação era tamanha que muitos chegaram a acreditar que a vacinação seria uma forma de matar a população mais carente e resolver de uma vez os problemas sociais no Brasil. A alternativa encontrada foi se rebelar.

Consequências

Os primeiros focos da agitação popular foram registrados no dia dez de novembro, multidões se reuniram no cento da cidade e começaram uma verdadeira rebelião. Carros e bondes foram depredados, comércios saqueados, iluminação e calçamento públicos foram destruídos. O caos era generalizado, para conter a revolta o governo precisaria endurecer a repressão.

O centro do Rio de Janeiro mais parecia um campo de batalha, para conter os populares foi preciso recorrer à ajuda das forças armadas que utilizaram um verdadeiro arsenal para destruir os focos da revolta. Foram utilizadas bombas nos bairros e embarcações de guerra em volta da capital federal. A obrigatoriedade da vacinação foi suspensa temporariamente, o governo decretou estado de emergência para solucionar a crise.

A intensificação da repressão acabou por sufocar o movimento e a punição dos envolvidos deveria ser exemplar para evitar que novas rebeliões ocorressem. A Revolta da Vacina deixou um saldo de trinta mortes e mais de cem feridos. O castigo dos revoltosos variava desde castigos físicos, prisões e deportações para o Estado do Acre.

Com o fim da revolta o governo prosseguiu normalmente com as campanhas de vacinação. Esse movimento envolveu um conjunto de fatores que mostram o descaso com o bem estar das populações mais carentes, a rebelião não foi só contra a vacina, mas também contra a situação humilhante com a qual os desvalidos são obrigados a conviver.

Lorena Castro Alves
Graduada em História e Pedagogia

você pode gostar também

Os comentários estão fechados, mas trackbacks E pingbacks estão abertos.