Suicídio, é preciso falar sobre isso!
No mês dedicado à prevenção do suicídio, é preciso quebrar o tabu e tratar de um problema que não escolhe vítimas, mas apresenta seus sinais de alerta.
Suicídio. A palavra assusta, não? Mas, sabe o que assustam mais? As estatísticas. No Brasil, 28 pessoas tiram sua própria vida diariamente e, para cada morte, há de pelo menos dez a 20 tentativas. A epidemia silenciosa que não escolhe gênero, raça, idade ou classe social é um problema de saúde ignorado pela sociedade por, em pleno século XXI, se tratar de um tabu.
O ápice da tentativa de acabar com uma dor insuportável desperta discussões sérias especialmente ao alto índice de ocorrências entre crianças e adolescentes. Por isso, o assunto deve entrar em pauta nas famílias, escolas e academia levando à necessidade de informação cada vez mais ampla sobre o tema.
O que é o suicídio?
Na definição acadêmica, o suicídio é o ato intencional de matar a si mesmo, ou seja, de tirar a própria vida de forma voluntária. O termo é derivado de dois vocábulos latinos – sui (de si mesmo) e caedere (matar). A decisão vem como resultado de uma experiência traumática que o indivíduo não conseguiu superar sozinho ou com ajuda de terceiros.
Causas para o suicídio
A verdade é que as causas para o suicídio permanecem como um mistério, até mesmo entre os especialistas. Em artigo publicado no site Psicologias do Brasil, o psiquiatra José Manuel Timóteo menciona que, nos suicidas, identifica-se a associação de desesperança perante a incapacidade de resolver problemas.
Por isso, mudanças bruscas como divórcio, luto, desemprego, falência, doenças graves e problemas enfrentados na escola aparecem como possíveis gatilhos para o suicídio. Teorias recentes apontam também para uma predisposição individual ativada por experiências traumáticas que originam determinados pensamentos negativos.
Em reportagem publicada pela revista Time, foi apontada a descoberta do gene SKA2 que influencia o controle de sentimentos negativos e da impulsividade. Sendo assim, o estudo sugere ligação direta com o ato suicida. No entanto, fatores psicológicos e sociais aparecem como grandes responsáveis, incluindo esquizofrenia, bipolaridade, depressão e outras perturbações mentais.
Por vezes, indivíduos neste estado mental sofrem com delírios e convicções com as quais não conseguem lidar. Nisso, estão incluídos o isolamento, a sensação de desintegração social e de não pertencer a determinados grupos. O perfil psicológico e a forma como um indivíduo reage às mudanças que lhe são apresentadas influenciam sua tendência suicida. Abusos toxicológicos constituem outro fator desencadeador do suicídio.
A depressão, inclusive, pode se intensificar com o consumo de álcool que, também reduz o autocontrole. Prova disso é que, segundo o MSD Manual Virtual, cerca de 30% daqueles que tentam se suicidar consomem álcool antes da tentativa. O alcoolismo provoca sentimentos de remorso durante a sobriedade, por isso os alcoólatras são propensos ao suicídio mesmo enquanto sóbrios.
Independente da causa, o ponto é que a pessoa se vê diante de uma dor psicológica intolerável frente à variabilidade da vida. A partir daí, enxerga na morte uma solução consolidada e definitiva.
Existe um perfil de suicida?
Voltando ao artigo publicado pelo site Psicologias do Brasil, a autora aponta dados estatísticos que caracterizam os suicidas entre indivíduos com maior ou menor predisposição para o ato. Mencionando relatório da Sociedade Portuguesa de Suicidologia, os seguintes perfis são traçados pelo texto:
- Suicida típico: homem maior de 45 anos que usa métodos como enforcamento, veneno ou arma de fogo mediante ato premeditado.
Para-suicida (suicídio não consumado): mulher com idade inferior a 25 anos, casada, empregada que usa métodos farmacológicos ou armas brancas, como faca, mediante ato impulsivo - Depressão: aparece como responsável por cerca de 50% dos casos
É observado que o comportamento suicida se manifesta em todas as faixas etárias e ambos os sexos. Em 2014, os Estados Unidos registraram 42.773 suicídios consumados, na média de uma morte a cada 12,3 minutos. O Manual MSD virtual também procurou traçar um perfil para os suicidas:
- 1º lugar: pessoas entre 45 e 64 anos
- 2° lugar: pessoas entre 25 e 34 anos
- 3º lugar: pessoas entre 10 e 24 anos
- 4º lugar: pessoas entre 35 e 64 anos
Em todas as faixas etárias, os homens aparecem como os maiores suicidas numa proporção quatro vezes maior que as mulheres. Entre motivos, aparecem menor propensão a procurar ajuda, além do abuso de álcool e outros medicamentos. O relatório lista os seguintes fatores de risco para o suicídio:
- Ser do sexo masculino
- Portar doença dolorosa ou incapacitante
- Viver sozinho
- Dívidas ou pobreza
- Desemprego
- Luto ou perda
- Humilhação ou desonra
- Depressão, especialmente se acompanhada de psicose ou ansiedade
- A maioria dos transtornos de saúde mental sérios
- Tristeza persistente, mesmo quando outros sintomas da depressão estão diminuindo
- Histórico de abuso de drogas ou álcool
- Histórico de tentativas prévias de suicídio
- Histórico de suicídio ou transtornos de saúde mental na família
- Experiências traumáticas na infância, incluindo abuso físico ou sexual
- Preocupar-se com suicídio e falar sobre ele
- Planos suicidas bem definidos
Países com maior índice de suicídios
Atualmente, China e os países do Leste Europeu despontam com os maiores índices de suicídio. Confira as taxas estimadas para as naçõe que concentram as taxas mais altas de suicídio no mundo:
- Bielorrússia: 20,5 suicídios a cada 100.000 habitantes
- Letônia: 20,8 suicídios a cada 100.000 habitantes
- Sri Lanka: 11 pessoas por dia
- Japão: 21,4 suicídios a cada 100.000 habitantes
- Hungria: 21,7 suicídios a cada 100.000 habitantes
- Eslovênia: 21,8 suicídios a cada 100.000 habitantes
- Cazaquistão: 25,6 suicídios a cada 100.000 habitantes
- Guiana: 26,4 suicídios a cada 100.000 habitantes
- Coreia do Sul: 28,1 suicídios a cada 100.000 habitantes
- Lituânia: 31 suicídios a cada 100.000 habitantes
- Nova Zelândia: 15,6 suicídios a cada 100.000 habitantes
- Belarus: 20,5 suicídios a cada 100.000 habitantes
- Rússia: 38,7 suicídios a cada 100.000 habitantes
- Brasil: 31 pessoas por dia
Suicídio no Brasil
Levantamento do Ministério da Saúde com dados de 2016 mostram o registro de 11.433 mortes por suicídio no Brasil, o que equivale a 31 ocorrências por dia. No entanto, o governo estima números ainda maiores devido à subnotificação nos registros. Com isso, estima-se um subdiagnóstico de 20% das mortes por atos suicidas.
O órgão faz um alerta sobre o crescimento nas ocorrências. Em 2016, a taxa de mortalidade por suicídio no Brasil foi 5,8 casos a cada 100 mil habitantes. Em 2007, esse índice era de 4,9 mortes a cada 100 mil habitantes, o que equivale ao aumento de 18%. O relatório aponta ainda que a taxa de mortalidade é maior entre homens com taxa de 9,2 casos a cada 100 mil habitantes nesse grupo.
Entre as mulheres, a taxa é de 2,4 a cada 100 mil habitantes. Porém, quanto às tentativas, ocorrências entre o sexo feminino são a maioria. A situação é ainda pior entre a população indígena, com taxa de 44,8% de suicídios registrados na faixa etária de 10 a 19 anos. Outro alerta emitido foi quanto às altas taxas de casos por intoxicação.
As regiões com maior número de ocorrências foram o Sudeste (49%) e Sul (25,1%). A última, inclusive, concentra o maior índice de suicídios no país. A maior parte das vítimas por intoxicação eram de mulheres, a maioria jovens. Entre os estados, Sergipe, Ceará e Goiás são aqueles com maiores taxas de suicídio por intoxicação exógena.
Suicídio na adolescência
A adolescência é um período de transição no qual é normal acontecer conflitos internos e transformações. Estes fatores são propícios para o surgimento de distúrbios como transtorno bipolar e depressão, além de ceder a pressões impostas pela sociedade. Tais pontos favorecem ao cenário ideal para o comportamento suicida.
De acordo com especialistas, existem fatores que favorecem pensamentos e tentativas de suicídio nessa faixa etária, entre eles:
- depressão
- problemas amorosos ou familiares
- uso de álcool ou drogas
- bullying
- traumas emocionais
O suicídio segue como a quarta maior causa de mortes entre pessoas de 15 a 29 anos. O Mapa da Violência de 2014 apresenta os dados mais recentes sobre a taxa de suicídio de adolescentes no Brasil. Números mostram aumento de 40% das ocorrências entre jovens entre 10 e 14 anos.
Na faixa etária de 15 a 19 anos, o crescimento foi de 33%, número que, em 2018, ganhou força com casos relacionados a desafios virtuais como Baleia Azul e Boneca Momo. Porém, há uma lista de sinais que os pais podem identificar a fim de evitar que o pior aconteça. Alguns são comuns aos apresentados por adultos enquanto outros são passíveis de confusão com comportamentos típicos da adolescência:
Fase inicial:
- Tentativas de suicídio anteriores
- Mudanças repentinas de comportamento
- Ameaça de suicídio ou expressão/verbalização de intenso desejo de morrer
- Ter um planejamento para o suicídio
- Sinais observáveis de depressão
- Oscilação de humor
- Pessimismo
- Desesperança
- Desespero
- Desamparo
- Ansiedade, dor psíquica, estresse acentuado
- Problemas associados ao sono (excessivo ou insônia)
- Intensa raiva
- Desejo de vingança
- Sensação de estar preso e sem saída
- Isolamento: família, amigos, eventos sociais
- Mudanças dramáticas de humor
- Falta de sentido para viver
- Aumento do uso de álcool e/ou outras drogas
- Impulsividade e interesse por situações de riscos
Fase crônica, na qual o adolescente está bem próximo do ato:
- Desfazer-se de objetos importantes
- Conclusão de assuntos pendentes
- Fazer um testamento
- Despedir-se de parentes e amigos
- Casos extremos de irritabilidade, culpa e choro
- Fazer carteira de doação de órgãos
- Comprar armas, estocar comprimidos
- Fazer seguro de vida
- Colocar coisas em ordem
- Súbito interesse ou desinteresse em religião
- Fechar a conta corrente
Jogo da Baleia Azul
O Jogo da Baleia Azul refere-se a um desafio originado por uma rede virtual russa que propõe 50 desafios, sendo o suicídio como a etapa final. Durante um tempo, os participantes vão trocando mensagens enquanto “curadores” se responsabilizam por propor as atividades.
A lista inclui tarefas simples, como desenhar uma baleia azul até outras bem mais sérias, como mutilação e o suicídio. Aqueles que recebem as mensagens do “curador” são intimados por meio de ameaças a participar do jogo. O jogo logo ultrapassou os limites do país europeu e chegou a países do mundo inteiro, inclusive o Brasil.
Em 2017, suicídios de jovens fizeram com que investigações ligassem os casos à participação no desafio. Entre eles, uma adolescente brasileira de 16 anos, uma jovem de 15 que se jogou de um edifício e uma menina de 14 que se atirou na frente de um trem. Os casos geraram comoção mundial e, no Brasil, especialistas e nomes ligados ao mundo virtual adolescente se envolveram em campanhas de alerta e prevenção.
Desafio da Boneca Momo
Uma figura assustadora ultra pálida, de cabelos longos e pretos, com um sorriso abominável. Esse é o perfil da Boneca Momo, novo desafio virtual que vem preocupando pais e autoridades. O jogo incentiva crianças e adolescentes a cometerem atos de violência, se mutilarem e até mesmo cometer suicídio.
A imagem viralizada é uma escultura japonesa conhecida como “Mulher Pássaro”, inspirada na lenda de uma mãe que morreu durante o parto e adquiriu a capacidade de transformar em outros seres para estar próxima a seus filhos. Os olhos grandes remetem ao pássaro que tem conhecido instinto protetor com os filhos.
A corrente surge de forma similar ao jogo da Baleia Azul – um criminoso se passa pela boneca e faz exigências ao receptor, enviando conteúdos de ódio e violência explícita. A primeira suposta vítima brasileira foi um menino de 09 anos encontrado morto pela mãe, na cidade de Recife.
Suicídio – sinais de alerta
“Quem quer fazer, faz e não avisa”. Sim, avisa, os sinais são bem claros e sua identificação podem salvar uma vida! O fato é que um suicida não quer morrer mas, acabar com um sofrimento intenso que o aflige. Por isso, costuma emitir alguns alertas antes do ato derradeiro no sentido de pedir ajuda. Então, é muito importante estar atento a todos eles. Veja quais são os seis mais comuns.
Frases de alarme:
“Eu quero morrer”, “não aguento mais”, “minha vontade é de sumir”, “queria dormir e não acordar nunca mais”. Ok, muitas vezes, em situações difíceis acabamos fazendo comentários como esse. Porém, a coisa fica perigosa se a pessoa os exprime com muita frequência. Frases desse tipo estão entre as mais ouvidas por terapeutas e serviços de ajuda, como o CVV.
Drogas e depressão
Em entrevista à Revista Galileu, o psiquiatra Humberto Corrêa da Silva Filho alerta que a quase totalidade das pessoas que cometeram o suicídio enfrentaram algum problema de cunho psicológico, especialmente a depressão. Por isso, pessoas depressivas e dependentes químicos são aqueles que merecem maior atenção. Isso porque as alterações de humor relacionadas ao consumo de drogas contribuem para o coeficiente de suicídio.
Comportamentos inesperados
O rapaz que adorava sair, mas que, de repente, não sai do quarto. A jovem vaidosa que se torna desinteressada. A mulher que tinha hábitos saudáveis, mas deixou tudo de lado. Esse tipo de mudança brusca merece atenção e, muitas vezes, esconde a inadaptabilidade a alguma alteração na rotina, como perda de emprego. Por isso, por mais arredia que a pessoa esteja, é importante se aproximar e entender o que se passa.
Melhoras repentinas de estado
Uma pessoa extremamente depressiva, de repente, se mostra feliz e recuperada? Cuidado com isso! Simular uma melhora é um comportamento muito frequente entre os suicidas, portanto é imprescindível acompanhar alguém que tenha melhoras de estado repentinas.
Interesse nulo em qualquer coisa
Um índice aproximado a 15% dos pacientes depressivos comete suicídio, mas apesar de parecer pouco, a depressão grave ainda é a maior causa das tentativas. Sendo assim, se alguém perto de você perdeu o interesse na própria vida e nos outros, demonstra baixa autoestima e se isola, fique atento, pois são sinais urgentes.
Não confunda “aborrescência” com depressão
A adolescência é uma fase de muitas transformações e, por vezes, o jovem se mostra rebelde ou descontente com sua própria realidade. No entanto, o que muitos têm por “aborrescência” pode esconder uma grave depressão. Se um adolescente se tranca no quarto, não quer falar com ninguém e perde o interesse pelas coisas, é a forma como demonstra seu sofrimento e isso precisa ser atendido.
Comportamento suicida – como identificar
O conceito de comportamento suicida inclui deve ser traçado de forma distinta do que é chamado de ideação suicida. Esta dá nome à fase na qual o indivíduo cultiva pensamentos e planos. Sendo assim, o comportamento suicida é designado como a junção das seguintes etapas:
tentativa de suicídio: o ato de autoagressão que intenciona a morte, mas que não obtém sucesso. A tentativa pode ou não causar alguma lesão ao indivíduo
suicídio consumado: quando o indivíduo obtém êxito na tentativa que resulta em sua morte.
Outro conceito importante que precisa ser analisado é o da automutilação não suicida. Trata-se do ato de autoagressão, como arranhões, queimar-se com cigarro, dose excessiva de medicamentos ou cortes que se apresentam como meios de reduzir a tensão. Mesmo que, à primeira vista, não intencionam a morte, configuram como pedidos de ajuda que não podem ser menosprezados.
Como ajudar um suicida
Ao identificar sinais de comportamento suicida, o auxílio e atenção devem ser imediatos. Alguns cuidados iniciais básicos, como conversar com a pessoa e não deixá-la sozinha, são imprescindíveis. Nesse momento, ouça mais e fale menos, pois quem está nesta situação precisa ser ouvida.
Além disso, elimine qualquer item que seja um instrumento em potencial, como cordas, facas ou medicamentos. E, acima de tudo, jamais deixe de procurar orientação profissional. O CVV dispõe de um canal telefônico gratuito, o 188, que se presta ao auxílio psicológico de quem passa por quadros depressivos graves.
Setembro Amarelo
O Setembro Amarelo é uma campanha lançada no Brasil como forma de prevenção ao suicídio. A iniciativa foi lançada em 2015 pelo Centro de Valorização da Vida (CVV), em conjunto com o Conselho Federal de Medicina (CFM) e a Associação Brasileira de Psiquiatria (ABP).
A escolha do mês de setembro se deve ao fato de que, no dia 10 de setembro, considera-se o Dia Mundial de Prevenção do Suicídio, por iniciativa da International Association for Suicide Prevention.
Durante todo o mês, são promovidos eventos que abrem espaço para debates sobre tema, além de divulgar alertas sobre a importância de sua discussão envolvendo especialistas e parentes de vítimas. Ao longo da campanha, locais públicos costumam ser iluminados com a cor amarela.
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