A tática de privar sono em reality shows para causar conflitos

Entre os programas acusados, estão ‘Squid Game: O Desafio’ e ‘Casamento às Cegas’, ambos da Netflix.

Os famosos reality shows, populares em todo o mundo, se tornaram grandes fontes de receita para as emissoras, uma vez que chamam a atenção do público e de patrocinadores.

Porém, há algum tempo começaram a surgir denúncias de ex-participantes que afirmam terem sido maltratados em realities como Squid Game: O Desafio e Casamento às Cegas, da Netflix, que podem colocar em xeque a credibilidade desses programas.

Em suma, esses reclamantes dizem terem sido expostos a condições degradantes que aparentemente eram conduzidas intencionalmente para estimular a audiência dos programas.

Frio, privação de sono, vômitos e enxaqueca

Em um passado não muito distante, o assunto “reality show” era sempre associado a programas no melhor estilo “Largados e Pelados”, onde os participantes tinham que literalmente lutar por sua sobrevivência.

Com o passar do tempo, a atenção dos telespectadores e dos patrocinadores se voltou a uma “pegada” mais “cult”, digamos assim. Isso modificou a cara dos realities, trazendo-os aos formatos atuais.

Hoje em dia, o mais comum é ver pessoas confinadas em mansões onde são desafiadas a conviver entre si e, claro, a vencer alguns desafios em forma de provas de resistência, raciocínio, etc.

Entretanto, mesmo que hoje os participantes de reality shows não estejam mais lutando contra a natureza, são impelidos a lutar uns contra os outros. Pelo menos isso é o que reclamam alguns ex-participantes revoltados.

Como exemplo, Melissa Rimsza, uma estudante de 22 anos que participou de Squid Game: O Desafio, afirma que foi obrigada a dormir em armazéns sem janelas sob um frio congelante quando participou do reality, em sua primeira temporada.

Outro ex-participante de reality, o norte-americano Jeremy Hartwell está processando a Netflix por alegadamente ter sido privado de sono e exposto a altas quantidades de bebida alcoólica quando participou de Casamento às Cegas, outro programa do streaming.

Nick Thompson, que também participou de Casamento às Cegas, relata ter desenvolvido enxaqueca e episódios de vômitos dias após ter gravado cenas para o programa.

“Até hoje as pessoas me perguntam: ‘Para que você se inscreveu para esse programa?’ Até passarem quatro dias lá dentro você percebe que teve talvez duas, três horas de bom sono sólido. Aí você entende que nunca deveria ter estado ali”, lamenta.

(Imagem: divulgação)

Vale tudo pelo marketing?

Junto com as muitas reclamações, esses ex-participantes de realities questionam os motivos pelos quais essas práticas são aceitas. Seria pelo marketing?

Para Jeremy Hartwell, absolutamente todos os programas desse tipo trabalham com a privação de sono de seus participantes.

“Todos estes reality shows de TV encontram alguma maneira de implementar a privação do sono. Você tem de questionar porque é que isso está acontecendo”, alerta.

O empresário Alex Hobern, que participou do reality ‘O Círculo’, acredita que os produtores têm a intenção de estimular os participantes cruelmente. “Sinto que a privação do sono é intencional”, admitiu ele.

Há quem acredite, inclusive outros ex-participantes, que para ser emocionante um reality precisa ser “pesado” para o seu elenco. Por outro lado, há o entendimento de que pessoas emocionalmente estáveis criariam espetáculos melhores.

Seriam casos de indução de humor?

Diante dos fatos expostos por ex-participantes de realities, surgem ainda algumas teorias sobre o motivo pelo qual os produtores desses programas supostamente privam os participantes de sono, especialmente.

Segundo os reclamantes, essa seria uma forma de induzir o humor do elenco, gerando mais atrito e um ambiente de insatisfação geral que chamaria mais a atenção do público.

De acordo com especialistas, a privação de sono eleva os níveis de cortisol (o hormônio do estresse) no cérebro, devido ao estado de alerta prolongado.

Assim, os participantes de realities seriam levados, de forma totalmente premeditada, a se tornarem reativos, menos empáticos, menos pacientes e até mais violentos.

Em seu relato, Jeremy Hartwell descreveu como era e o que se tornou durante sua participação em Casamento às Cegas.

“Sempre fui uma pessoa emocionalmente estável e emocionalmente controlada. Porém, ao sair do reality eu estava chorando facilmente e com uma raiva inexplicável”, disse.

O que diz a Netflix e outras emissoras?

Quando questionados pela reportagem original do The Guardian, tanto a Netflix quanto as produtoras Studio Lambert e Kinetic Content, produtora responsável por Squid Game: O Desafio, O Círculo e Casamento às Cegas, respectivamente, se recusaram a se manifestar sobre as acusações.

Atualmente, existem diversos órgãos em todo o mundo interessados em criar regulamentações justas sobre o que pode e o que não pode ser feito em reality shows.

Esses quadros legais seriam uma bússola, que ainda não existe, para todos os aspectos de tratamento a participantes de reality, não apenas no que diz respeito ao sono.

Para a empresária Fiona Fletcher, que tem uma empresa voltada à promoção de bem-estar em produções de filmes e programas de TV, o caminho é longo e complicado, mas possível de ser percorrido.

“Os produtores devem ser capazes de criar conteúdo atraente sem comprometer a ética. No entanto, muitas empresas não têm financiamento ou treinamento suficientes para implementar procedimentos abrangentes de saúde mental e bem-estar – e esse papel geralmente pode recair sobre a equipe inexperiente.”, afirmou.

* Com informações de The Guardian

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