As contribuições de Henri Wallon com a afetividade no processo de aprendizagem
O educador francês se aprofundou na questão da influência das emoções no processo evolutivo, dividindo a vida psíquica em três dimensões.
Já ouviu dizer que, lembranças boas e ruins afetam, de formas diferentes, o aprendizado de uma criança? Por exemplo, um educador atencioso, que presta atenção em cada necessidade da criança, desperta memórias positivas e contribuem de forma benéfica para a aprendizagem, certo?
Ao mesmo tempo, um educador muito austero, que ofende ou é impaciente ao ensinar, pode afetar de forma negativa criando, inclusive, bloqueios de aprendizado na criança. Os dois aspectos estão, diretamente, ligados ao conceito de afetividade de Henri Wallon e sua ligação com o desenvolvimento.
O conceito de afetividade
Vamos voltar, rapidinho, ao exemplo citado lá em cima. O estímulo ou repulsa ao aprendizado foram afetados por elementos externos (olhar, volume da fala, gritos ou incentivos) e internos (medo, alegria, segurança). Como pode ser visto, estas emoções internas têm tanto origem negativa quanto positiva, certo?
Tal condição humana é o que chamamos de afetividade e, perante o exemplo, podemos afirmar que ela não diz respeito, apenas, a carinho e amor. A afetação, tanto boa quanto ruim, faz com que o indivíduo reaja a tais estímulos, o que pode comprometer, de formas diferentes, no seu processo evolutivo.
Estudiosos, como Lev Vygotsky e Jean Piaget, já haviam afirmado sobre a importância da afetividade mas, foi Wallon quem tratou o tema com profundidade. Para ele, as emoções exercem papel predominante no desenvolvimento pois, é por meio delas, que o indivíduo exterioriza desejos, vontades e apatia.
Ou seja, a criança nasce com recursos biológicos que lhe dão a capacidade de se desenvolver. No entanto, é o meio que vai permitir que as potencialidades orgânicas se desenvolvam. Assim, o estudioso divide a vida psíquica em três dimensões, sendo elas afetiva, motora e cognitiva. Tais dimensões coexistem e se integram.
Em outro exemplo prático, temos uma criança pronta para aprender a falar. Ela tem boca, cordas vocais e dispositivos sensoriais que lhe permitem o ato da fala, certo? Mas, se ao tentar balbuciar suas primeiras sílabas, um adulto a repreende, surgirá um bloqueio e o bebê passa a ter medo de falar.
Porém, do contrário, caso ele seja estimulado com elogios e, até mesmo, impelido a tentar outras palavras pelos pais, o desenvolvimento da fala será muito maior. Além de dividir a vida psíquica, Henri Wallon separa o desenvolvimento em cinco etapas que são listadas a seguir:
- impulsivo-emocional: orienta as primeiras reações da criança em sua primeira idade na qual a afetividade é predominante
- sensório-motor e projetivo: à medida em que a criança evolui, seus atos motores partem dos mentais
- personalismo: o indivíduo começa a construir sua consciência a partir das interações sociais
- categorial: é o momento em que há progressos intelectuais, isto é, o desenvolvimento das aptidões sociais e intelectuais da criança
- funcional: muito presente na puberdade e adolescência, faz notar os primeiros contornos da personalidade em razão das modificações corporais resultantes dos hormônios.
Como a afetividade se expressa?
De acordo com Henri Wallon, o primeiro ano de vida expressa a afetividade com maior intensidade. Por ela, o bebê se expressa e interage com as pessoas que, por sua vez, respondem a tais manifestações. Porém, a afetividade está presente em todas as fases da vida e podem ser exteriorizadas de três formas:
- emoção: é a primeira expressão da afetividade e, normalmente, não é controlada pela razão. É quando temos o impulso de bater em alguém que nos ofende, mesmo sabendo não ser a melhor atitude.
- sentimento: é a forma de expressão que já tem ligação com o cognitivo, ou seja, o indivíduo consegue sofre aquilo que o afeta.
- paixão: a principal característica é o autocontrole. Lembra da situação de bater em alguém que o ofende? Com a paixão, o indivíduo consegue “se segurar”.
A emoção é a mais visível das expressões e pode ser manifestada, inclusive, por meio da fala. Com ela, o indivíduo consegue externalizar o que sente, desde seu nascimento. Trata-se da primeira manifestação de necessidade afetiva da criança, demonstrada quando chora ou quando ri.
Por isso, é a dimensão que ganha mais destaque nas obras de Wallon e, também, aquela que mais se relaciona com a educação. Através dela, o educador consegue visualizar quando seu aluno está entusiasmado com determinada dinâmica e, ao mesmo tempo, se outro está apático ou cansado, podendo usar isso a seu favor.
Relação afetividade e processos de desenvolvimento
O processo de desenvolvimento é regulado por determinados princípios reguladores dos princípios de aprendizagem. Mesmo que em proporções diferentes, tais princípios são os mesmos em crianças e adultos.
- Do sincretismo para a diferenciação
O sincretismo é caracterizado pela imperícia que, aos poucos, será substituída pelos processos de diferenciação. A aprendizagem começa pelo sincretismo e passa, de forma gradativa, para o estágio seguinte.
- Imitação
É o instrumento pelo qual crianças e adultos iniciam o processo de aprendizagem quando expostos a situações novas.
- Acolhimento
O sentimento de segurança e pertencimento que determinado ambiente pode proporcionar à criança e, também, ao adulto.
- Desenvolvimento dos conjuntos funcionais
Os conjuntos funcionais são compostos pelo desenvolvimento afetivo, cognitivo e motor. Cada pessoa tem seu ritmo que precisa, então, ser respeitado por atividades correspondentes.
- Conflitos
Como veremos adiante, a emoção é contagiosa, por isso, comportamento do aluno e professor pode interferir na própria dinâmica da classe. Parte do professor a capacidade de resolver tais conflitos.
Como usar a afetividade na educação?
Na sala de aula, é comum perceber alunos extremamente empolgados e envolvidos nas atividades. Mas, ao mesmo tempo, o professor detecta aqueles um pouco mais apáticos e desestimulados. A presença desse tipo de comportamento pode ser o reflexo do próprio ambiente educacional que é, ou não, estimulante e motivador.
A dificuldade de aprendizagem é um problema de ensino, por isso, sua solução deve focar a relação ensino-aprendizagem, sem culpar a um ou outro. Se as necessidades afetivas não são satisfeitas, barreiras são criadas para o processo e, consequentemente, o desenvolvimento do aluno e do professor.
A manifestação da afetividade é, também, contagiosa. Já observou que, pais e professores nervosos geram crianças e alunos, também, nervosos? Isso acontece porque a afetividade é uma expressão física e, por isso, mobiliza a manifestação do outro, através da transmissão desse sentimento.
A relação entre a afetividade e educação está, também, aos conceitos de movimento e inteligência. O primeiro diz respeito à motricidade, ao caráter pedagógico através da qualidade do gesto e representação. Para Wallon, a rigidez das escolas deveria ser adaptada para que houvesse maior movimentação em sala de aula.
Quanto à inteligência, o estudioso trata o desenvolvimento intelectual nas escolas de forma mais humanizada. Isso quer dizer que afetividade, movimento e espaço físico devem ser colocados no mesmo plano. O que isso significa? Que o educador pode introduzir atividades pedagógicas que explorem noções de corpo, tempo e espaço.
Ademais, deve incentivar a relação interpessoal, tratando do respeito às diferenças e construção de identidade. Esses objetivos podem ser alcançados através de atividades que desenvolvam a coordenação motora, a percepção corporal e sensorial ou, ainda, a orientação espaço-temporal. São exemplos:
- músicas infantis
- fantoches
- dramatização de histórias e poesias infantis
- exposição de filmes, figuras e slides
- brincadeiras sonoras
- confecção de crachás de identificação e dinâmicas de grupo
Em suma, é necessário que o educador conheça seus alunos e aprenda a lidar com ele por meio do diálogo e da demonstração de afeto (em seu significado positivo). É preciso entender que o papel do professor é o de mediador do conhecimento e, por isso, a forma como se relaciona com o aluno reflete na absorção do conhecimento deste.
O educador deve, então, absorver teorias que o auxiliem no planejamento de sua relação com o aluno, levando em conta suas características individuais, as atividades propostas e o contexto no qual essa relação é construída.
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