Manuel Bandeira
Manuel Bandeira nasceu no Recife no dia 19 de abril de 1886. Faleceu no dia 13 de outubro de 1968, aos 82 anos, no Rio de Janeiro.
Manuel Carneiro de Souza Bandeira Filho ou apenas, Manuel Bandeira. Um dos maiores poetas da literatura brasileira, Bandeira foi, ao lado de Oswald e Mário de Andrade, um dos precursores do Modernismo, considerado um dos mais importantes representantes da poesia em nosso país. O poeta deixou uma rica e vasta obra, capaz de despertar o interesse de leitores e estudiosos em todo o país.
O escritor nasceu no Recife, capital pernambucana, no dia 19 de abril de 1886. Filho de Manuel Carneiro de Souza Bandeira e Francelina Ribeiro de Souza Bandeira, mudou-se com a família para o Rio de Janeiro em 1890, posteriormente para Santos, no interior paulista, retornando para a então Capital Federal logo depois. Em 1892 os Bandeira regressam para Recife, e aos seis anos o poeta passa a frequentar o colégio das irmãs Barros Barreto. A temporada na cidade natal seria curta, pois em 1896 a família estaria de volta no Rio de Janeiro e, em 1903, para São Paulo, onde Manuel Bandeira passa a frequentar a Escola Politécnica a fim de formar-se arquiteto. Nessa mesma época começa a trabalhar nos escritórios da Estrada de Ferro Sorocabana, da qual seu pai era funcionário.
Foi no final do ano de 1914 que o poeta descobriu uma grave enfermidade, cujas sequelas o acompanhariam até o final de sua vida: estava tuberculoso, e tal condição fez com que ele abandonasse suas atividades e retornasse para o Rio de Janeiro, onde o clima serrano era favorável a sua saúde. Viveu em diversas cidades, entre elas Campanha, Teresópolis, Maranguape Uruquê e Quixeramobim. Foi na escrita que Bandeira encontrou um refúgio para todos os problemas, e nela eles refletiam de maneira clara, às vezes de maneira melancólica, noutras, irônica.
Pneumotórax
“… – O senhor tem uma escavação no pulmão esquerdo e o pulmão direito infiltrado.
– Então, doutor, não é possível tentar o pneumotórax?
– Não. A única coisa a fazer é tocar um tango argentino.”
Considerado o mestre dos versos livres da poesia nacional, a subversão às formas fixas o poeta aprendeu com os escritores Apollinaire, Charles Cros e Mac-Fionna Leod. O ano era 1912, época em que o Parnasianismo dominava a literatura brasileira com seus poemas de forte apelo estético e valorização da cultura clássica greco-romana. A desobediência aos padrões estéticos vigentes já evidenciavam seu comportamento vanguardista, fundamental para a consolidação dos ideais modernistas que seriam apresentados ao Brasil no ano de 1922 por ocasião da Semana de Arte Moderna. Em 1913 parte para a Suíça para se tratar no Sanatório de Clavadel, onde conheceria Paul Eugène Grindel, poeta francês, autor de poemas contra o nazismo que circularam clandestinamente durante a Segunda Guerra Mundial.
Em virtude da eclosão da Primeira Guerra Mundial, em 1914, Bandeira volta para o Brasil em outubro desse ano. Em 1916, já instalado no Rio de Janeiro, publica seu primeiro livro A cinza da horas, cuja publicação, de 200 exemplares, fora custeada pelo próprio autor. Ainda em 1916 falece sua mãe, Francelina e, 1918 perde a irmã, Maria Cândida de Souza Bandeira, que cuidara do poeta desde o início de sua doença. Em 1919 publica seu segundo livro, Carnaval, novamente em edição custeada pelo escritor. Graças ao livro Carnaval Bandeira despertou o interesse e entusiasmo dos paulistas iniciadores do Modernismo: iniciaria então uma nova página em sua biografia.
O pai, Manuel Carneiro, falece em 1920. Em 1921 conhece Mário de Andrade e Oswald de Andrade, com os quais formaria a célebre tríade modernista. Morando no Rio de Janeiro, não participou da Semana de Arte Moderna, evento realizado em 1922 no Theatro Municipal de São Paulo. Para a ocasião remeteu o poema sátira Os sapos (disponível no final deste artigo), cuja leitura foi feita por Ronald de Carvalho na segunda noite dA Semana, considerada a mais importante. Meses depois vai a São Paulo, onde conhece Paulo Prado, Couto de Barros, Tácito de Almeida, Menotti del Picchia, Luís Aranha, Rubens Borba de Moraise Yan de Almeida Prado. Passa a colaborar com a revista Klaxon, revista mensal de arte moderna que circulou em São Paulo de 15 de maio de 1922 a janeiro de 1923. Morre, ainda em 1922, seu irmão, Antônio Ribeiro de Souza Bandeira.
Veja também: 15 poemas de Manuel Bandeira
Em 1924 reúne em um único volume as obras A Cinza das Horas, Carnaval e um livro inédito, O Ritmo Dissoluto, publicação que ficou conhecida como Poesias. Começa a colaborar no Mês Modernista, sério de trabalhos de modernistas publicado pelo jornal A Noite, em 1925. Escreve também sobre crítica musical para a revista A Ideia Iustrada e também para a revista Ariel, de São Paulo. Em 1926, a serviço de uma empresa jornalística, viaja para Minas Gerais, onde conheceria Carlos Drummond de Andrade. Segue viajando para várias cidades do país participando de bancas examinatórias de preparatórios.
O ano de 1930 marca a publicação de Libertinagem, uma de suas mais importantes obras. Em 1933 é nomeado, pelo então ministro da Educação, Gustavo Capanema, inspetor de ensino secundário. Em 1936, ano de seu cinquentenário, grandes comemorações foram feitas, entre elas a publicação de Homenagem a Manuel Bandeira, livro com poemas, estudos críticos e comentários de autoria dos principais escritores brasileiros. Nesse ano ainda publica Estrela da Manhã e Crônicas da Província do Brasil. Em 1937 recebe o prêmio da Sociedade Filipe de Oliveira pelo conjunto da obra e publica Poesias Escolhidas e Antologia dos Poetas Brasileiros da Fase Romântica. Em 1938 foi nomeado professor de literatura do Colégio Pedro II, no Rio de Janeiro, e membro do Conselho Consultivo do Departamento do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional.
Em 1940 Manuel Bandeira foi eleito para a Academia Brasileira de Letras, ocupando a vaga de Luís Guimarães Filho. Nesse ano publica Poesias Completas, Noções de História das Literaturas e, A Autoria das Cartas Chilenas. Em 1943 é nomeado professor de literatura hispano-americana da Faculdade Nacional de Filosofia, deixando então o cargo que ocupava no Colégio Pedro II. Recebe o prêmio de poesia do IBEC por conjunto de obra, em 1946. Publica Apresentação da Poesia Brasileira e Antologia dos Poetas Brasileiros Bissextos Contemporâneos.
Em 1950, a pedido de amigos, apenas para compor a chapa, candidata-se a deputado pelo Partido Socialista Brasileiro. Em 1954 publica Itinerário de Pasárgada e De Poetas e de Poesia. Em junho desse mesmo ano passa a colaborar como cronista no Jornal do Brasil, publicação para a qual Drummond viria a contribuir posteriormente. A parceria com o jornal estendeu-se até o ano de 1961, ano em que também deixou de escrever para a Folha de São Paulo.
Manuel Bandeira também foi biógrafo: em 1963 escreve as biografias de Gonçalves Dias, Álvares de Azevedo, Casimiro de Abreu, Junqueira Freire e Castro Alves, todos representantes do Romantismo brasileiro. Traduziu importantes peças, entre elas O Advogado do Diabo, de Morris West. Em 1966 comemora 80 anos de idade, recebendo várias homenagens, entre elas uma festa realizada pela Editora José Olympio, da qual participaram mais de mil pessoas. A saúde do poeta, debilitada por decorrência da frágil condição pulmonar, agrava-se, e no dia 13 de outubro de 1968, aos 82 anos, falece na cidade do Rio de Janeiro.
Para que você conheça um pouco mais a obra desse que é considerado um dos maiores poetas do século XX da literatura brasileira, o site Escola Educação selecionou cinco poemas de Manuel Bandeira para você apreciar. São versos que justificam toda a reverência em torno dessa figura que certamente é uma das mais importantes de nossas letras. Boa leitura!
Vou-me embora pra Pasárgada
Vou-me embora pra Pasárgada
Lá sou amigo do rei
Lá tenho a mulher que eu quero
Na cama que escolherei
Vou-me embora pra Pasárgada
Vou-me embora pra Pasárgada
Aqui eu não sou feliz
Lá a existência é uma aventura
De tal modo inconseqüente
Que Joana a Louca de Espanha
Rainha e falsa demente
Vem a ser contraparente
Da nora que eu nunca tive
E como farei ginástica
Andarei de bicicleta
Montarei em burro brabo
Subirei no pau-de-sebo
Tomarei banhos de mar!
E quando estiver cansado
Deito na beira do rio
Mando chamar a mãe-d’água
Pra me contar as histórias
Que no tempo de eu menino
Rosa vinha me contar
Vou-me embora pra Pasárgada
Em Pasárgada tem tudo
É outra civilização
Tem um processo seguro
De impedir a concepção
Tem telefone automático
Tem alcalóide à vontade
Tem prostitutas bonitas
Para a gente namorar
E quando eu estiver mais triste
Mas triste de não ter jeito
Quando de noite me der
Vontade de me matar
— Lá sou amigo do rei —
Terei a mulher que eu quero
Na cama que escolherei
Vou-me embora pra Pasárgada
O menino doente
O menino dorme.
Para que o menino
Durma sossegado,
Sentada ao seu lado
A mãezinha canta:
— “Dodói, vai-te embora!
“Deixa o meu filhinho,
“Dorme . . . dorme . . . meu . . .”
Morta de fadiga,
Ela adormeceu.
Então, no ombro dela,
Um vulto de santa,
Na mesma cantiga,
Na mesma voz dela,
Se debruça e canta:
— “Dorme, meu amor.
“Dorme, meu benzinho . . . “
E o menino dorme.
O anel de vidro
Aquele pequenino anel que tu me deste,
– Ai de mim – era vidro e logo se quebrou…
Assim também o eterno amor que prometeste,
– Eterno! era bem pouco e cedo se acabou.
Frágil penhor que foi do amor que me tiveste,
Símbolo da afeição que o tempo aniquilou, –
Aquele pequenino anel que tu me deste,
– Ai de mim – era vidro e logo se quebrou…
Não me turbou, porém, o despeito que investe
Gritando maldições contra aquilo que amou.
De ti conservo no peito a saudade celeste…
Como também guardei o pó que me ficou
Daquele pequenino anel que tu me deste…
Debussy
Para cá, para lá . . .
Para cá, para lá . . .
Um novelozinho de linha . . .
Para cá, para lá . . .
Para cá, para lá . . .
Oscila no ar pela mão de uma criança
(Vem e vai . . .)
Que delicadamente e quase a adormecer o balança
— Psio . . . —
Para cá, para lá . . .
Para cá e . . .
— O novelozinho caiu.
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Os sapos
Enfunando os papos,
Saem da penumbra,
Aos pulos, os sapos.
A luz os deslumbra.
Em ronco que aterra,
Berra o sapo-boi:
– “Meu pai foi à guerra!”
– “Não foi!” – “Foi!” – “Não foi!”.
O sapo-tanoeiro,
Parnasiano aguado,
Diz: – “Meu cancioneiro
É bem martelado.
Vede como primo
Em comer os hiatos!
Que arte! E nunca rimo
Os termos cognatos.
O meu verso é bom
Frumento sem joio.
Faço rimas com
Consoantes de apoio.
Vai por cinquüenta anos
Que lhes dei a norma:
Reduzi sem danos
A fôrmas a forma.
Clame a saparia
Em críticas céticas:
Não há mais poesia,
Mas há artes poéticas…”
Urra o sapo-boi:
– “Meu pai foi rei!”- “Foi!”
– “Não foi!” – “Foi!” – “Não foi!”.
Brada em um assomo
O sapo-tanoeiro:
– A grande arte é como
Lavor de joalheiro.
Ou bem de estatuário.
Tudo quanto é belo,
Tudo quanto é vário,
Canta no martelo”.
Outros, sapos-pipas
(Um mal em si cabe),
Falam pelas tripas,
– “Sei!” – “Não sabe!” – “Sabe!”.
Longe dessa grita,
Lá onde mais densa
A noite infinita
Veste a sombra imensa;
Lá, fugido ao mundo,
Sem glória, sem fé,
No perau profundo
E solitário, é
Que soluças tu,
Transido de frio,
Sapo-cururu
Da beira do rio…
Luana Alves
Graduada em Letras
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