O Pré-Modernismo
Considerado como um período de transição na literatura brasileira, o Pré-Modernismo não constitui uma escola literária, mas sim um momento de confluência de estéticas. Entre seus principais representantes estão Lima Barreto, Graça Aranha, Monteiro Lobato, Euclides da Cunha, nomes que dedicaram-se à prosa. Na poesia, seu principal expoente foi o poeta Augusto dos Anjos.
A literatura brasileira é, para fins didáticos, dividida em escolas literárias, o que facilita o estudo das diversas tendências estéticas de nossas letras. Entre os diferentes movimentos está o Pré-Modernismo, situado, aproximadamente, nas duas primeiras décadas do século XX, precedendo o movimento modernista que eclodiu no ano de 1922 com a realização da Semana de Arte Moderna, em São Paulo.
Não podemos dizer que o Pré-Modernismo constitui-se como uma escola literária, mas sim como um período de confluência de diferentes estilos. Os escritores que o integraram a literatura pré-modernista apresentavam características estilísticas que não se enquadravam em nenhuma estética vigente àquela época.
Para melhor compreender o Pré-Modernismo é necessário fazer um resgate histórico, haja vista que História e Literatura são ciências complementares. O avanço científico e tecnológico no início do século XX trouxe novas perspectivas à humanidade, trazendo também um clima de conforto e praticidade com as invenções do período. A literatura passou por um período fértil, oferecendo diferentes estéticas para o público, estéticas que transitavam entre o Parnasianismo, o Simbolismo e o Realismo.
Enquanto a Europa vivia a iminência da Primeira Guerra Mundial, o Brasil vivia a política do “café com leite”, que visava à predominância do poder nacional por parte das oligarquias paulista e mineira, e alternava o poder entre presidentes civis influenciados pelo setor agrário dos estados de São Paulo (grande produtor de café) e Minas Gerais (maior produtor de leite e maior pólo eleitoral do país à época).
Havia ainda uma série de conflitos em diferentes regiões do país, entre eles a Revolta de Canudos, na Bahia, a revolta da Vacina e da Chibata, no Rio de Janeiro, as greves operárias em São Paulo, a Guerra do Contestado, na fronteira entre os estados do Paraná e Santa Catarina, as lutas constantes pelo coronelismo e disputas provincianas, como aquelas que aconteceram no Rio Grande do Sul entre maragatos e republicanos.
Além desse contexto de guerras e revoltas, surgia a burguesia urbana, a industrialização, a segregação dos negros pós-abolição, o surgimento do proletariado e, finalmente, a imigração europeia. Todos esses fatores influenciaram os autores da época, cujas produções marcam a transição dos valores éticos do século XIX para uma nova realidade que se desenhava no país.
Características do Pré-Modernismo
- Ruptura com o academicismo;
- Ruptura com o passado e a linguagem parnasiana;
- Linguagem coloquial, simples;
- Exposição da realidade social brasileira;
- Regionalismo e nacionalismo;
- Marginalidade das personagens: o sertanejo, o caipira, o mulato;
- Temas: fatos históricos, políticos, econômicos e sociais;
Estão, entre os principais autores do período:
- Lima Barreto (1881-1922): Afonso Henriques de Lima Barreto, conhecido como Lima Barreto, foi um escritor e jornalista brasileiro. Sua importância extrapola os limites literários: foi um dos poucos de nossa Literatura a combater o preconceito racial e a discriminação social do negro e do mulato. Escreveu dezenove livros, entre eles Clara dos Anjos, obra póstuma, Cemitério dos Vivos, livro póstumo e inacabado, e seu mais famoso romance, Triste fim de Policarpo Quaresma (1915).
- João do Rio (1881-1921): João do Rio é um dos pseudônimos de João Paulo Emílio Cristóvão dos Santos Coelho Barreto, considerado pela historiografia como o maior jornalista de seu tempo. Além de jornalista, João do Rio foi escritor e precursor da crônica social moderna: sua obra foi produzida a partir da observação direta da vida e da linguagem de diferentes grupos sociais do Rio de Janeiro do início do século XX. Figura querida e popular, João transitava com facilidade entre as camadas populares e marginalizadas, produzindo crônicas que investigavam a vida da gente esquecida com grande realismo e sensibilidade.
- Augusto dos Anjos (1884-1914): As inovações temáticas e de estilo fizeram de Augusto dos Anjos um importante poeta brasileiro, embora tenha publicado apenas um livro ao longo de sua vida. O “mau gosto” do vocabulário rebuscado e científico, a dimensão cósmica, a angústia moral e o pessimismo de sua poesia – características encontradas em um de seus mais famosos poemas, Psicologia de um Vencido – tornaram-no um escritor sem igual na Literatura Brasileira, cuja vida e obra ainda despertam o interesse do público.
- Euclides da Cunha (1866-1909): Euclides Rodrigues da Cunha foi escritor poeta, ensaísta, jornalista, historiador, sociólogo, geógrafo, poeta e engenheiro. Entre os anos de 1903 e 1906 ocupou a cadeira de número 7 na Academia Brasileira de Letras. Sua principal obra é Os Sertões: Campanha de Canudos, obra regionalista de 1902 que retrata a vida do sertanejo e a Guerra de Canudos, ocorrida no interior da Bahia. O livro é dividido em três diferentes partes: A Terra, O Homem, A Luta.
- Graça Aranha (1868 – 1931): José Pereira da Graça Aranha foi um escritor e diplomata maranhense. Foi também um dos fundadores da Academia Brasileira de Letras e um dos organizadores da Semana de Arte Moderna de 1922. Sua obra que merece destaque é Canaã, publicada em 1902, cujo enredo aborda a migração alemã no estado do Espírito Santo. Outras obras que merecem destaque são: Malazarte (1914), A Estética da Vida (1921) e Espírito Moderno (1925).
- Monteiro Lobato (1882-1948): José Bento Renato Monteiro Lobato foi um escritor, editor, ensaísta e tradutor brasileiro. Um dos mais influentes escritores do século XX, Monteiro Lobato ficou muito conhecido por suas obras infantis de caráter educativo como, por exemplo, a série de livros do Sítio do Picapau Amarelo. Em 1918 publica “Urupês” uma coletânea regionalista de contos e crônicas. Já em 1919 publica “Cidades Mortas” livro de contos que retrata a queda do Ciclo do Café.
O Pré-Modernismo no Enem
(Enem – 2014)
Psicologia de um vencido
Eu, filho do carbono e do amoníaco,
Monstro de escuridão e rutilância,
Sofro, desde a epigênese da infância,
A influência má dos signos do zodíaco.
Profundissimamente hipocondríaco,
Este ambiente me causa repugnância…
Sobe-me à boca uma ânsia análoga à ânsia
Que se escapa da boca de um cardíaco.
Já o verme – este operário das ruínas –
Que o sangue podre das carnificinas
Come, e à vida em geral declara guerra,
Anda a espreitar meus olhos para roê-los,
E há de deixar-me apenas os cabelos,
Na frialdade inorgânica da terra!
(ANJOS, A. Obra completa. Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 1994. )
A poesia de Augusto dos Anjos revela aspectos de uma literatura de transição designada como pré-modernista. Com relação à poética e à abordagem temática presentes no soneto, identificam-se marcas dessa literatura de transição, como
- a forma do soneto, os versos metrificados, a presença de rimas, o vocabulário requintado, além do ceticismo, que antecipam conceitos estéticos vigentes no Modernismo.
- o empenho do eu lírico pelo resgate da poesia simbolista, manifesta em metáforas como “Monstro de escuridão e rutilância” e “Influência má dos signos do zodíaco”.
- a seleção lexical emprestada do cientificismo, como se lê em “carbono e amoníaco”, “epigênesis da infância”, “frialdade inorgânica”, que restitui a visão naturalista do homem.
- a manutenção de elementos formais vinculados à estética do Parnasianismo e do Simbolismo, dimensionada pela inovação na expressividade poética e o desconcerto existencial.
- a ênfase no processo de construção de uma poesia descritiva e ao mesmo tempo filosófica, que incorpora valores morais e científicos mais tarde renovados pelos modernistas.
Resposta: Letra “d”. Augusto dos Anjos é, conforme enunciado da questão, um poeta de transição. Sua obra caracteriza-se pela influência dos movimentos literários anteriores. Do Parnasianismo, o poema Psicologia de um Vencido mantém a métrica rigorosa dos sonetos e as rimas opostas (A-B-B-A); do Simbolismo, aproveita a espiritualidade expressa no trecho “A influência má dos signos do zodíaco”. Embora a questão não considere a influência do Naturalismo, podemos observar uma aproximação com esse período por meio do vocabulário científico.
Luana Alves
Graduada em Letras
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